Diários da pandemia - #Dia 5: indignação
Durante os 12 dias que ficamos em isolamento, no início da pandemia de Covid-19, eu e minha esposa decidimos escrever diariamente sobre um tema que escolhíamos, relacionado àquele momento de tensão e incerteza, tentando nos manter serenos e filtrar o bombardeio de notícias, fake news e tudo o mais que vinha da rua.
Passados 3 anos desses dias isolados e do pior da pandemia, vou reproduzir aqui - com permissão da Cacá - esses textos que refletem como estávamos vendo e vivendo aquele período tão diferente de tudo o que havíamos vivido até então, e que nos ajudaram a ficarmos conectados à realidade e a nós mesmos.
#DIA 5 (25/03/2020) - TEMA: INDIGNAÇÃO
Ela:
Indignar-se.
Ser provocado. Desgostar-se, aborrecer-se, zangar-se, irritar-se, irar-se.
Molestar-se, ofender-se. Seria a indignação aquela centelha necessária
para repensarmos as coisas, questionarmos, iniciarmos o movimento de
mudança? Ou ela traria consigo ira, ranço, cegueira - nos impedindo
de pensarmos com clareza em como devemos agir perante a situação
que nos desagrada? É difícil mensurar, encontrar o equilíbrio e ponderar nos
momentos difíceis: entender se a indignação está nos causando o
desconforto necessário ou nos empurrando ladeira abaixo, nos afastando do
que acreditamos e de quem somos. Exercitar a empatia – colocar-se no lugar do
outro- parece praticamente impossível quando nos sentimos feridos, manipulados
ou provocados e, consequentemente, indignados. Mas talvez o correto seja
fazermos exatamente isto: procurar entender o que levaria uma pessoa a
desencadear estes sentimentos negativos em nosso íntimo. Quais suas motivações
e objetivos: o que ela pretende quando nos provoca. Se depois disto ainda nos
sentirmos feridos e provocados, agirmos ponderada e conscientemente, mantendo a
capacidade de discernimento acima da nossa indignação. Precisamos entender,
acima de tudo, que nenhum sentimento negativo deve ser a justificativa para
atos que não condizem com nossa forma de viver e pensar. Nossa verdade é o que
temos de mais precioso, e só nos sentimos confiantes e fortes quando percebemos
que agimos através dela.
Eu:
Dia de indignação contra a ignorância, que, a
seu modo, pode ser a pior das epidemias e impor os maiores danos. E a indignação é maior quando nos sentimos
impotentes frente à ignorância alheia, que não é ignorante só por ser alheia,
mas por atentar contra qualquer razoabilidade. Indignação por ver o errado, o injusto e o mal
ocuparem espaços que lhes seriam inadmissíveis, mas dos quais se apropriaram e
de onde obscurecem qualquer racionalidade, apesar dos protestos dos que,
indignados, ainda enxergam com alguma clareza. No entanto, a indignação forma as ondas que
provocam as rachaduras que levam à ruptura de uma situação insustentável, e
assim sucessivamente, até que o equilíbrio se instala, ao que também chamamos
de paz ou, apenas, bom senso.
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