Diários da pandemia - #Dia 11: o machismo no isolamento
Durante os 12 dias que ficamos em isolamento, no início da pandemia de Covid-19, eu e minha esposa decidimos escrever diariamente sobre um tema que escolhíamos, relacionado àquele momento de tensão e incerteza, tentando nos manter serenos e filtrar o bombardeio de notícias, fake news e tudo o mais que vinha da rua.
Passados 3 anos desses dias isolados e do pior da pandemia, vou reproduzir aqui - com permissão da Cacá - esses textos que refletem como estávamos vendo e vivendo aquele período tão diferente de tudo o que havíamos vivido até então, e que nos ajudaram a ficarmos conectados à realidade e a nós mesmos.
O
isolamento social segue desafiando e revelando... O que por algum tempo pareceu
uma oportunidade de resgate da vida doméstica, com a redução do ritmo de
trabalho e a redescoberta de cantinhos, livros e objetos queridos que estavam
de lado, se transforma gradualmente em motivo de apreensão e estranhamento.
Começamos a perceber o machismo do nosso dia a dia. Aquele que nós nem notamos
porque fica nas entrelinhas, enrustido, resultado de nossa criação e da
sociedade em que nos formou. Curiosamente neste tipo de machismo, sofrem os dois-
pois não há relação de domínio, apenas suas consequências permeando a
relação... O charme da divisão de tarefas já não tem tanta graça e não notamos
mais sorrisos ou empolgação no preparo das refeições ou na arrumação do jardim-
nosso parceiro está preocupado em voltar a priorizar seu trabalho, seu sucesso:
o resgate de sua autoestima passa necessariamente por isto. Também sentimos
falta de nossa individualidade, de nosso trabalho, da rotina antiga: mas
conseguimos com facilidade ser confortadas pela casa- sempre tivemos mais
intimidade com ela. Para nossos companheiros, ela ainda não é reconhecida como
espaço de pertencimento, e em algum momento eles “descobrem” estar invadindo um
lugar que no fundo entendem ser essencialmente feminino. Infelizmente, ainda
não vivemos em território neutro...
Estar em isolamento é difícil pra
todos, mas pior pra alguns e pior ainda pra algumas, as mulheres, vítimas do
machismo e, muitas vezes, de sua face mais sinistra: a violência contra a
mulher. Compartilhar o confinamento com seu algoz, torna a situação que já é
por si só estressante em desesperadora, ainda mais quando há filhos menores
envolvidos. Por outro lado, o machismo pode sair dessa pandemia enfraquecido e
os casais fortalecidos, se o tempo isolados servir para uma melhor divisão de
tarefas da casa, maior diálogo e compreensão mútua. Seria bom...
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