OS OUTROS PAIS DA NOSSA INFÂNCIA


Quando morre o pai de um amigo nosso de infância, é como se uma daquelas casas e ruas que habitam as lembranças daquele tempo ficasse de repente mais vazia. Esses pais dos nossos amigos eram os outros pais da nossa infância. Quando estávamos em suas casas, brincando e explorando o mundo ao redor, eles também nos cuidavam, sentiam-se responsáveis pelo nosso bem-estar e segurança, até chegar a hora de irmos embora. Uns mais sérios e rígidos. Outros, amáveis e que interagiam conosco, lembrando de como brincavam na sua época ou advertindo sobre os perigos dos nossos dias, mas sempre na medida necessária para não estragar a diversão. Muitos desses outros pais que tivemos e que nos viram crescer acabaram se tornando nossos amigos – talvez porque também exercitaram a paternidade conosco e se afeiçoaram àqueles amiguinhos dos seus filhos como se fôssemos um pouco deles também. Depois, ao longo da nossa vida, vamos reencontrando ocasionalmente esses segundos pais e, juntos, voltamos no tempo compartilhando lembranças e histórias vividas em comum, de quando éramos crianças enquanto eles tinham mais “filhos” para cuidar. Enfim, o que ameniza a perda que sentimos é saber que sua ausência das casas e ruas da nossa memória é apenas transitória. Logo, logo, já voltam a ocupar seus lugares cativos em nossas lembranças, com a vantagem compensatória de que agora terão todo o tempo para zelar por nós de outro plano espiritual...

*Texto em homenagem a um dos outros pais da minha infância, Seu Getúlio Caletti.

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